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21/08/2009

vice-ministro vaiado

As mesas de literatura, na Conferência Internacional sobre Óscar Ribas, foram, para mim, as melhores no seu conjunto. Até o Pires Laranjeira gostei de ouvir falar, colocando com exatidão Óscar Ribas enquanto autor (e obra) intermédio que pode ser puxado pelo discurso nacionalista, pelo nativista, pelo colonial, etc., mas que é mesmo intermédio. O tom geral das comunicações nessas mesas foi no mesmo sentido, de resto evidente e assumido pelo próprio Óscar Ribas. É, portanto, de estranhar que Luís Kandjimbo, Virgílio Coelho e Jorge Macedo tenham atacado violentamente a comunicação de Abreu Paxe que, partindo do conceito de fronteira de Lotman, disse exatamente o mesmo que Pires Laranjeira e os outros, eu próprio incluído. Disse mais que isso não era de estranhar porque o autor era um mestiço cultural e biológico, lembrando que ele se definia também assim - o que de resto já tinha sido lembrado pelo testemunho, vital, de um dos seus informantes. E que, se ele era o exemplo da angolanidade, a angolanidade era um conceito de fronteira. Um crime, não haja dúvidas... Perante o 'crime', quiseram obrigar o ensaísta, poeta e professor universitário a modificar a sua comunicação com a ameaça velada de não a publicarem caso não a mudasse. E tudo isso porquê? Porque o vice-ministro Luís Kandjimbo entendia (e bem) que as conclusões de Paxe são parecidas com as de M. António (que Abreu Paxe confessou nunca ter lido e eu sei que é verdade). Luís Kandjimbo disse que M. António tinha trazido muitos equívocos à cultura angolana, equivocos graves, perigosos, etc., e que ele próprio (M. António) nos últimos anos da sua vida se terá afastado das suas teorias sobre as ilhas crioulas angolanas - o que é uma completa mentira, que só podia ser dita por alguém que não sabe (ou pensa que os outros não sabem) como foram os últimos anos de vida de M. António. Baseado nessas falaciosas argumentações (na verdade, o único equívoco está na cabeça do Luís Kandjimbo, que parece não se livrar do fantasma do M. António), baseado nessas falaciosas argumentações, repito, Kandjimbo recomendou vivamente a Abreu Paxe a mudança no texto da sua comunicação antes da publicação, com uma ameaça não muito velada, pois ele não se devia esquecer que as comunicações eram para publicar... Ato contínuo Virgílio Coelho, a 'moderar' a mesa, intimou Abreu Paxe a assumir ali que mudaria a comunicação. Foi nesse ponto que a assembleia ali reunida, com especialistas, académicos, escritores (poucos), estudantes, reagiu vaiando ambos, chegando vozes a falar em "censura", "violência" e a dizer, repetidamente, "isso não". Uma vergonha que devia levar o vice-ministro a demitir-se ou pedir, pelo menos, desculpas. Ao invés disso a ministra toma em seguida a palavra. Disse que falava como historiadora, o que só naquele momento disse. E disse que não foi a conferência de Berlim que definiu as fronteiras angolanas. Que grande historiadora, não haja dúvidas... Pensava talvez nas mudanças, pouco significativas, que vieram depois (o saliente de Cazombo, por exemplo). Abreu Paxe podia tê-la desmentido imediatamente, mas preferiu reagir com elegância e com prudência. A sessão encerrou-se. O que se fez no intervalo? Abertamente Luís Kandjimbo e Jorge Macedo foram ter com Abreu Paxe, não para se explicarem, mas para o ameaçarem, dizendo que ele devia mudar de ideias e de companhias porque andava mal acompanhado... Isto não é comportamento para um membro do governo. Luís Kandjimbo, no entanto, perdeu a máscara. Agora todos temos a obrigação de nos precavermos contra este ministério: quando foi o festival de cinema a ministra defendeu a censura a um filme; no Encontro sobre Óscar Ribas o vice-ministro tenta obrigar um conferencista a mudar o texto da sua comunicação. Não é só lamentável. É inadmissível.